segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Reportagem de Jornalismo de Imprensa

Peças com histórias de vida

Um espaço com história permite a mostra, troca e venda das mais variadas antiguidades. Em pleno quarto sábado de Novembro, o movimento em Coimbra não é o mesmo de outros dias do mês. Cruzam-se velhos e novos vendedores e visitantes, ao sabor do sol acompanhado de uma brisa fria.

São nove horas da manhã e na Praça do Comércio vêem-se comerciantes a montar mesas ou a estender panos no chão onde colocam as suas peças antigas. Poucos são ainda os visitantes que se encontram no recinto da feira. Mas já se vêem alguns dos mais adeptos.
Miguel Graça é um dos forasteiros mais antigos deste evento e da cidade de Coimbra. Vem à Feira das Velharias de Coimbra “todos os meses” desde o seu início, época em que “só se vendia azulejo antigo”, conta Miguel que é natural do Porto. Este apreciador de velharias já se desloca à cidade há muitos anos para passear. Ao gosto por Coimbra acrescenta-se o surgimento deste certame como motivo para Miguel rumar do norte ao centro do país: “Não preciso disto para nada. Agora venho por vício.”
A feira, criada oficialmente no mês de Julho de 1991, decorre num espaço histórico a nível comercial da cidade (antiga Praça Velha). O Vereador da Cultura da Câmara Municipal de Coimbra, Mário Nunes, reforça que “de há 17 anos a esta parte esta [feira] tem sido, indubitavelmente, uma das preocupações do Município”.
A exposição de artigos envelhecidos é um “êxito de referência no panorama nacional” que junta “inúmeros feirantes de antiguidades provenientes de diversos pontos do país”, afirma Mário Nunes. E também muitos visitantes entusiastas pelo culto do antigo ou simples curiosos. Por isso, esta feira contribui para o alargamento das relações humanas no contexto social, possibilitando aos visitantes a descoberta das origens de algumas das tradições passadas, fazendo com que o passado e o presente se cruzem.
No acontecimento estão expostos para venda e/ou troca múltiplos produtos nacionais e estrangeiros que ajudam a promover a arte e cultura de Portugal. Vêem-se espalhados pelo chão e mesas livros, cartões postais, relógios e moedas, azulejos, bijutaria, sinos, peças de cerâmica, joalharia, ourivesaria, latoaria e diversos utensílios domésticos. Encontra-se um pouco de tudo.
Um dia passado junto das antiguidades é diferente. Quebra a rotina monótona de muitos idosos e proporciona aos jovens conhecer peças de outros tempos. Ao final da manhã e início da tarde, o número de pessoas que circulam pela feira é maior. Os habitantes e visitantes da cidade deixam o aconchego das suas casas e a habitual companhia televisiva para passear pela Praça do Comércio e vislumbrar um ambiente que não o do quotidiano.
Tem 71 anos e é habitante de Coimbra há 28 anos. Maria Júlia Saraiva aprecia os livros antigos, aqueles que pertencem à sua geração, por terem mais história. As pessoas mais velhas têm um apreço maior por este tipo de coisas, “mas já há muitos jovens a querer”, refere Maria. O tempo está agradável e convida a visitar pela Baixa de Coimbra, mas nem sempre é assim. Quando chove e faz muito frio, a feira empobrece-se.
Entre os feirantes, encontra-se Cristina Pereira, uma principiante nestas andanças, e Lídia Abreu, que vem a Coimbra desde a primeira exposição realizada. Estas duas senhoras entraram neste mundo de forma distinta. A mais recente comerciante conta: “Comecei por brincadeira. Achei que tinha coisas que me queria desfazer delas e não sabia como.”
O gosto pelas velharias deve-o ao marido, que desde novo tem uma paixão por peças antigas. Lídia Abreu regressou de Inglaterra em 1981, onde tinha uma loja ligada a este ramo, e começou a participar em feiras destas em 1991. No início, “vendia-se muito bem, tudo e mais alguma coisa”, relata a comerciante. Actualmente, as pessoas continuam a mostrar interesse por antiguidades, mas a crise económica vivida não permite comprar tudo aquilo que se aprecia: “Não é uma das primeiras necessidades, é mais uma paixão.”
A habitante de Águeda (Aveiro) só vende e troca peças inglesas (por inglesas), tem preferência pelo vidro coalhado e, hoje em dia, apenas faz a feira de Coimbra e a de Aveiro, esta última que se realiza ao quarto domingo de cada mês. A Feira das Velharias de Coimbra não tem rendido muito para Lídia: “É uma feira livre, uma pessoa mesmo que não venda não pagamos nada porque se tivéssemos de pagar pela deslocação, por vezes, não dava para vir cá”. Outro benefício que tem é a preferência de lugar a ocupar por ser das mais antigas, enquanto que os novos feirantes têm que esperar pela técnica do departamento de Cultura da CMC, Aurélia Filipe, para lhes ser atribuído um lugar para expor as suas peças.
Este acontecimento é promovido por uma Comissão Organizadora, formada em reunião do Executivo Municipal de 10 de Julho de 1991 e da qual fazem parte a Câmara Municipal de Coimbra, a Junta de Freguesia de São Bartolomeu, a Polícia de Segurança Pública, a Escola C+S Silva Gaio, o Grupo de Arqueologia e Arte do Centro, o “Velhustro” e a “Livraria Minerva”. Actualmente, esta é designada Comissão de Feira. Cabe a esta comissão fazer um acompanhamento constante desta iniciativa, pois é responsável pela supervisão do espaço físico onde decorre a feira e da fidedignidade dos produtos nela expostos para venda. Aurélia Filipe é habitualmente a pessoa que desenvolve o processo de organização do evento, mas de momento encontra-se de férias, daí que tenha sido impossível contactá-la.
Ainda são 17h30 e já se vêem muitos expositores a desmontar as suas bancas improvisadas. Fogem antes do anoitecer, enquanto outros aguardam que a confusão das arrumações abrande, como é o caso de Lídia. O marido vem mais tarde carregar as velharias pois só assim consegue entrar no recinto da praça com a carrinha: “Se vier um bocadinho antes não consegue cá entrar, tem de ir lá para trás para o estacionamento e é um problema”.
Habitualmente, a feira prolonga-se até às 19h00, mas nos meses de Inverno o sol esconde-se mais cedo, deixando a Praça do Comércio vazia. Muitos dos comerciantes rumam para outras feiras e outros esperam pelo próximo mês.

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